segunda-feira, 5 de julho de 2010

Há declínio da feminilidade ?

Ida Amaral Brant Machado¹

Após o percurso no texto freudiano sobre a feminilidade, onde ela é apresentada como um “vir a ser e não como um ser” o caminho do “tornar-se mulher” é tortuoso e muitas vezes não alcançado, levando em consideração as três saídas propostas por Freud.

Durante um dos seminários lembrei de um texto que tinha lido, “O Dragão e o Santo” de Ana Portugal, onde a autora , partindo de um texto de Freud, de 1913, “A disposição neurose obsessiva –Uma contribuição ao problema da escolha da neurose”, relata essa passagem do “dragão” para o santo- sainthomme,sinthoma. Freud,no seu artigo traz algumas hipóteses que depois são abandonadas(ex. experiências sexuais passivas na primeira infância predispunham à histeria e as ativas à neurose obsessiva), mas defende a idéia de uma organização sexual pré-genital anal-sádica que algumas mulheres regridem quando “liquidam sua função genital”. A escolha da neurose tem caráter de disposições, são independentes de experiências que operam patogenicamente( a escolha não depende da experiência, a escolha da neurose não está fora do sujeito).Freud , em 1913 fala desses traços anais sádicos que aparecem com o declínio da feminilidade, a jovem esposa e amante que se transforma em um velho dragão, como uma regressão da vida sexual ao estagio pré-genital sádico-anal-erótico.


“...as mulheres frequentemente, após ter liquidado sua função genital alteram seu caráter de forma particular, tornam-se briguentas, irritantes e despóticas, mesquinhas e sovinas, mostram típicos traços sádicos e anal-eróticos, que anteriormente, na época da feminilidade, não lhe eram próprios. Os autores de comedias e satiristas de todos os tempos dirigiram suas invectivas contra o “velho dragão” em que se transformaram a moça encantadora, a esposa amante e a terna mãe.”

Ana Portugal ressalta no seu artigo a expressão “velho dragão”, no alemão cotidiano corresponde ao “guardião da ordem da disciplina, mas não oficialmente, apenas por questões de preferência ou de estilo pessoal”. Acontece no plano pessoal e profissional, a pessoa mantem uma vigilância excessiva sobre gastos, economia de luz, água telefone, pontualidade etc. Há de se marcar a diferença entre a escolha da neurose (sintoma) e o carater. Na primeira há fracasso no recalque e retorno do recalcado; o sintoma é testemunho da precariedade de que o sujeito se sustenta como um; é acessível à analise, há conflito e esforço para impedir que a regressão ocorra; há divisão psíquica (splitting);na via do traço o sujeito reafirma sua posição frente ao fracasso da relação sexual. Já na segunda (caráter) a posição é estagnada,congelada; o traço se sustenta pleno de sentido ou alcança sem dificuldades o objetivo de substituir o recalcado por formações reativas e sublimações;regressão a organização sexual pré-genital sádica-anal-erotica; não há divisão(ponto duro);processos de formação de caráter são mais obscuros e menos acessíveis à analise.

Maria chega a sua sessão queixando-se de todos os transtornos que tem vivido com a menopausa. Alem das mudanças hormonais e o mal-estar físico diz que nem ela está se agüentando, está irrascível ,irritante, insuportável e acrescenta:

-Ida, você não acha que em vez de menopausa deveria ser menohomem, pois minha libido foi para o saco.

A direção na analise de Maria é fazer desse ponto duro, algo que se possa escrever do sintoma, já que o sintoma é o que vem do real, um novo rearranjo pulsional uma outra amarração dos três registros, onde seja possível savoir y faire com seu sinthoma.

¹ Psicanalista Membro da Escola Freudiana de Belo Horizonte/iepsi

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